As aulas presenciais continuam suspensas. A situação que estamos vivenciando é completamente inédita e assusta a todos, pois em pouco tempo tivemos que nos adequar a vários novos hábitos.
Uma das grandes preocupações é que as desigualdades sociais ficam mais destacadas a cada nova fase do isolamento social. E, com as atuais medidas setorializadas de enfrentamento ao Coronavírus, onde alguns bairros de Salvador passaram a sofrer medidas mais restritivas, a perspectiva de retorno às atividades escolares ainda este ano torna-se mais e mais distante.
Conforme eu já disse anteriormente, a pandemia do novo Coronavírus obrigou as escolas e as famílias a se adequarem a uma realidade de ensino a distância (EaD) que se mostra incompatível com a estrutura da grande maioria dos domicílios brasileiros.
Eu percebo que o principal desafio atualmente na educação é a continuidade do ano letivo durante pandemia, principalmente se analisarmos que há o risco que milhares de estudantes percam o ano e também sejam prejudicados em provas, tais como ENEM e vestibulares, por causa da disparidade digital.
A verdade é que muitas famílias têm nenhuma forma de acesso à internet e outros tantos nem sequer têm computador em suas casas. Esta realidade distancia cada vez mais os estudantes.
Afora a questão tecnológica, também devemos nos ater ao aspecto intelectual que muitas famílias de baixa renda também são formadas por pessoas de pouca instrução formal e, ainda, mesmo os que estudaram, não têm a opção de ficar em casa acompanhando as atividades escolares de seus filhos, pois continuam trabalhando fora de casa.
Em qualquer dos casos, os estudantes não têm o apoio e a estrutura necessários para enfrentar as mudanças nas rotinas e formas de ensino. Com tantas mudanças, um dos problemas é fazer as crianças e adolescentes entenderem que não estão de férias e precisam se concentrar nos estudos. Disciplina, foco e organização são atitudes que devem ser mantidas, principalmente em tempo de quarentena.
Entre os entraves relatados pelos profissionais de educação está a baixa participação dos estudantes nas aulas de ensino à distância, a falta de infraestrutura e tecnologia para assistir às aulas em casa e as condições psicológicas para, por exemplo uma preparação tão importante como o vestibular, em um momento como esse. Lembrando da baixa efetividade da EaD, que não resolve grande parte das dúvidas dos alunos.
Como educador eu destaco que o ambiente escolar permite relações que ali são desenvolvidas, experiências do cotidiano de um colégio, que são indispensáveis tanto para as crianças, quanto para os adolescentes. As relações interpessoais (entre os colegas e também entre os alunos e professores), bem como os conflitos do dia a dia são primordiais na formação do intelecto.
Em relação ao conteúdo didático, os educadores reforçam que, principalmente pelo prolongamento do isolamento social, é hora de ser simples, realinhar as expectativas de aprendizagem e privilegiar aquilo que é fundamental para apoiar os alunos nesse processo de aprendizagem.
A escola, e também os pais, não podem partir do pressuposto que a aprendizagem presencial será idêntica à virtual. Importante a redefinição das expectativas de aprendizagem.
Outra questão é como será feito o acompanhamento dos conteúdos disponibilizados via EaD? Como esses alunos serão avaliados para ver se, de fato, eles estão aprendendo? De nada adiantará todo esse esforço que está sendo feito para lançar o bloco da EaD na rua como uma solução emergencial se as alternativas escolhidas não assegurarem que de fato as crianças e os jovens aprendam.
Neste momento em que as escolas estão iniciando a aplicação de provas e verificando a questão de notas e boletins, cabe negociar, inclusive, com o Ministério da Educação sobre o que será feito com a carga horária.
Lembrando que, segundo a Lei de Diretrizes e Bases, caso a suspensão das aulas se estender por vários meses, os 200 dias letivos obrigatórios poderiam ser flexibilizado em até 25%.
O texto da MP 934 joga a responsabilidade sobre a normatização de como as horas-aula serão cumpridas sobre os conselhos estaduais e municipais de educação, o que pode ser motivo de preocupação.
Passado o período de isolamento social, pós-pandemia, as escolas que adotarem o EaD precisarão fazer um diagnóstico do que foi assimilado e bem aprendido nessa modalidade. Porém, quanto aos alunos que estão se preparando para entrar no ensino superior inevitável ver que ficam algumas lacunas.
Infelizmente eu percebo que a pandemia está impondo um enorme choque não só nas crianças e adolescentes, mas também nos jovens que estão já pensando em um curso de formação universitária, em uma carreira.
O isolamento social está interrompendo sua educação e treinamento e colocando enormes obstáculos no caminho dos que estão tentando entrar em um curso superior, que busque vaga no mercado de trabalho ou pretenda trocar de emprego.
Por conta da crise econômica, muitos jovens podem estar tentados a abandonar a escola e entrar no mercado de trabalho (para ajudar suas famílias). Mas acho fundamental tentar mantê-los estudando.
Com investimento na educação e no capital humano, ensinando os jovens a aprender (e não só a estudar), mantendo programas de mentoria e aprendizagem e combinar aprendizado no trabalho com educação afasta-se o perigo de jovens que entram no mercado de trabalho em um momento ruim e depois levarem mais tempo para se recuperar disso.
ARTIGO ORIGINALMENTE PUBLICADO NO SITE POLÍTICA AO VIVO